segunda-feira, 7 de junho de 2010

Musicália indica...


Carnaval Ijexá

O autor Antonio Risério, através de estudos e uma investigação peculiar, presenteia os leitores com uma belíssima visão sobre os comportamentos da população de Salvador através da afirmação da identidade negra.

50 Anos de Trio Elétrico



Fred Góes, mais uma vez, nos surpreende e traz um livro cheio de informações sobre a história dos trios elétricos desde a sua origem até a atualidade. O livro traz muitas fotos e vários depoimentos de artistas que participaram e participam da manifestação cultural.

Matéria Especial: A máquina de fazer alegria



Salvador, década de 1930. Dorival Caymmi, Adolfo Nascimento (Dodô), Alberto Costa e Zezinho Rodrigues formavam o grupo musical Três e Meio, responsável por animar as festas da cidade. Como também se apresentavam em rádios, começaram a fazer sucesso no estado. Em 1938, Caymmi decide ir para o Rio de Janeiro e o grupo é reformulado e passa a contar com sete integrantes. Entre eles estava Osmar Macedo. E foi assim, através da música, que Dodô e Osmar se encontraram.

Em 1942, no cine Guarani foi mostrado ao público o “violão eletrizado”, através do violonista clássico Benedito Chaves. Dodô e Osmar foram assistir ao show, a fim de conhecer o instrumento. Era um violão tradicional e tinha um captador localizado na boca. Mais havia um problema, já que apresentava microfonia (ruído decorrente da realimentação de um som já amplificado, através de um microfone). Dodô, querendo eliminar esse problema, fez um violão igual ao do violinista, mas não adiantou. Daí fez um cavaquinho para Osmar e assim a “Dupla Elétrica” estava formada.

“Eles tocavam com instrumento acústico e dava muita microfonia, não podia aumentar o volume. Então eles começaram a fazer experiência. Chegaram na oficina de Dodô que era radio técnico, em uma bancada eles colocaram um prego de cada lado, estenderam uma corda de instrumento e aí botou o captador em baixo e começou a tocar. Aumentava o volume e não dava microfonia. Então eles sacaram que o “cepo maciço” do instrumento evitava o fenômeno da microfonia. E aí fizeram o protótipo que é o pau elétrico”, explica André Macedo. Assim nasceu a guitarra baiana.

Até 1949 a “Dupla Elétrica”, produzindo seus instrumentos, tocavam em festas e bailes. No ano seguinte, pouco antes do carnaval, o navio que transportava o Clube Carnavalesco Vassourinhas de Recife que iria realizar uma apresentação no Rio de Janeiro, aportou em Salvador e á pedido do então governador Otávio Mangabeira, fizeram uma apresentação na Rua Chile. Durante a apresentação, o povo se misturou aos músicos formando uma aglomeração, resultando em um acidente com um dos integrantes do Vassourinhas, que teve os dentes quebrados. Dodô e Osmar estavam no meio da multidão.

No dia seguinte, a dupla resolveu criar uma nova forma de brincar carnaval, de divertir o povo. Osmar pegou no galpão de sua oficina um Ford 1929 e ornamentou o veículo com bolinhas coloridas em referência aos confetes, muito utilizados na época no carnaval. Além disso, fez duas placas em formato de violão, onde escreveu “Dupla Elétrica”. Radio técnico, Dodô teve a ideia de confeccionar uma fonte de energia para que através da corrente da bateria do carro, fosse possível o funcionamento dos alto-falantes. A Fobica estava pronta para o carnaval.

“Então domingo eles foram sair da Piedade para a Praça da Sé. Eu estava lá. O Osmar ficava em cima da Fobica tocando cavaquinho, Dodô no violão e o sogro dele (Osmar) Armando, tocando pandeiro. Embaixo tinha alguns percussionistas”, recorda Orlando Campos, criador do Trio Tapajós.

Uma multidão começou a acompanhar a dupla. Mas na descida da Ladeira de São Bento, o carro começou a produzir fumaça. “Osmar gritou para o motorista dele que era o Olegário e falou: ‘Para, para que a Fobica está fumaçando e dançando para um lado e para o outro’. Aí Olegário respondeu: ‘Seu Osmar parado já estava há muito tempo. O povo é que está empurrando’. Naquela época para mim foi um momento histórico e daquele povo que estava empurrando a Fobica, eu era um deles”, conta Orlando com satisfação.

Em 1951, Temístocles Aragão foi convidado a se juntar a Dupla Elétrica. Osmar solava as músicas com o cavaquinho, Dodô com o violão fazia a marcação e Temístocles tocava o triolim, instrumento de harmonia. “Colocaram na lateral da nova caminhonete ( a Fobica tinha derretido o motor no carnaval de 50) o Trio Elétrico, e com isso, mesmo crescendo a quantidade de gente e o caminhão, o povo quando via dizia ‘ lá vem o trio elétrico’ e com isto estava consagrado o nome”, comenta Betinho Macedo.

E o caminhão continuou mesmo crescendo, pois no ano seguinte a fábrica Fratelli Vita passou a patrociná-los, aumentando o veículo, a quantidade de alto-falantes e iluminação. O Trio Elétrico além de se apresentar no carnaval de Salvador, estava participando de micaretas no interior da Bahia. O patrocínio da fábrica durou até 1957.

A partir de 1953, outros trios começaram a surgir em Salvador, entre eles o Ypiranga de Cristóvão Ferreira, o Jacaré que passaria a ser Saborosa, Atlas, Alvorada e o Cinco Irmãos, de Periperi.

E veio o Tapajós

Após o mês de fevereiro de 1956, Orlando Campos que já tinha formado seu conjunto elétrico no ano anterior, enfeitou uma caminhonete com bandeirolas e gambiarras e colocou a banda para tocar. Com patrocínio de pequenos comerciantes, amigos e do Clube Flamenguinhos do qual Orlando fazia parte, o Trio Tapajós fez o carnaval de Periperi.

A Prefeitura de Salvador resolve patrocinar Dodô e Osmar em 1958 e no ano seguinte são convidados pelo governador de Pernambuco a tocar em Recife, animando o carnaval com o patrocínio da Coca-Cola.

Durante esse período, Orlando continuava fazendo o carnaval no Subúrbio Ferroviário. Em 1960, Dodô e Osmar fizeram o último carnaval deles, visto que após a festa o sogro de Osmar, Armando Meirelles morre. Como ele era o grande incentivador do trio elétrico, eles decidiram parar.

Ainda em 60, Orlando compra uma das carrocerias de Dodô e Osmar. O trio Tapajós, já tinha algumas melhorias, como a inclusão de um banheiro improvisado e um motor, produzido por Dodô. Em 1961, fez cinco micaretas com o patrocínio da Coca-Cola nas cidades de Alagoinhas, Feira de Santana, Catu, Pojuca e São Sebastião do Passé.
Com a parada de Dodô e Osmar, Orlando foi o responsável por manter o sonho do trio elétrico e em 1962, traz o Tapajós à Salvador. “Um amigo meu que era vereador, era muito amigo do prefeito na época. Ele conseguiu colocar o Tapajós no carnaval em 62. A minha alegria redobrou. Carnaval de Salvador pela primeira vez. Saio do subúrbio para a capital”, conta Orlando. O Tapajós nesse ano foi vice-campeão, ficando atrás apenas do Jacaré.

Assim o Tapajós se tornou mais conhecido em Salvador e Orlando queria evoluir ainda mais. “Eu quero preparar um trio sem ser ele acoplado no caminhão. Eu quero ele acoplado no chassi do caminhão. Tirava a carroceria do caminhão e preparava o trio elétrico” lembra. A carroceria de Dodô e Osmar comprada por ele serviu de base para fabricação desse trio, quando ele criou a carroceria de metal.

Em 63, volta ao carnaval o trio de Dodô e Osmar em um carro alegórico montado sobre uma carreta. Armandinho já atuava como solista estando com apenas 9 anos de idade. O Tapajós desfila com o patrocínio da Coca-Cola e no concurso de trios, é consagrado campeão.

“Em 1963, Armandinho já dedilhava com desenvoltura as músicas tocadas pelo pai no trio, e com o pau elétrico de seu pai que com justa alegria, fez um pequeno trio elétrico, saiu no carnaval de 64 com uma placa luminosa com os dizeres ‘Osmar apresenta seu filho Armando’ e em letras menores ‘Dodô e Osmar os foliões’, comenta Betinho Macedo.

A divulgação do Tapajós atingiu o nível nacional e nesse ano tocaram no carnaval de Recife, patrocinado ainda pela Coca-Cola. Nos três anos seguintes ganhou como melhor trio, se tornando tri-campeão.

A música “Atrás do Trio Elétrico”, foi lançada por Caetano Veloso em 1969. “Eu creio que Caetano Veloso fez da Fobica para homenagear todos os trios elétricos. Foi naquele ano. E aí o próprio Caetano falou: ‘ Nós temos Orlando que gravar um disco’, declara Orlando. E no mesmo ano o Tapajós gravou seu primeiro LP pela Philips, sendo o primeiro trio a gravar um disco, ainda com a música de Caetano. Cada vez mais conhecido no Brasil e com ajuda de Caetano que o levou para o Rio de Janeiro para reforçar o lançamento do disco, o Tapajós foi convidado a participar do Programa A Grande Chance da TV Tupi, cujo apresentador era Flávio Cavalcanti.

Em virtude da preparação de mais um trio elétrico para o carnaval, agora de 1972, Orlando viaja à São Paulo para trazer o que havia de novidade para o trio que iria construir. “Quando eu volto no avião e começo a ler uma revista, ali encontrei uma foto de uma nave supersônica. Aí eu olhei assim, isso aqui dá um trio elétrico da zorra, viu? O trio elétrico que eu vou fazer vai ser baseado nessa nave”, declara Orlando.

Caetano Veloso, que estava exilado em Londres anuncia a sua volta em 72, quando gravou a canção “Chuva, Suor e Cerveja” e mandou para o Brasil. Na terça-feira de carnaval de 72, sai no jornal A Tarde que Caetano estava de volta ao país. Orlando, ao ler o jornal decide prestar uma homenagem ao cantor e batiza seu mais novo trio: Caetanave.

No desfile do carnaval estavam na Caetanave, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Maria Bethânia, sem contar Dodô e Osmar. Além disso, houve o encontro entre Osmar na Caetanave e Armandinho, que fez o “Desafilho” quando se apresentava no trio Saborosa.

Jubileu de Prata


“Em 74, vendo se aproximar a data do Jubileu de Prata do trio elétrico no ano seguinte, nada melhor do que comemorar com um registro fonográfico, um LP, com a nova banda do trio, então composta por filhos de Dodô e de Osmar sob a batuta de Armandinho. Partimos para o Rio, lá chegando, em um encontro casual com o recém ex-Novos Baianos, Moraes Moreira achou a ideia fantástica e desde já como num passe de mágica e completamente entrosado no assunto, estava alí o primeiro cantor do trio elétrico e partimos para a gravação do nosso primeiro disco. Ah, e como é o nome do trio? Com os seguidores vieram tapajós, marajós (1972) etc e o nosso? Foi quando em um bate papo, Caetano veloso disse: ‘Façam uma homenagem aos criadores, bote o nome Dodô e Osmar’. E aí, com este nome, gravamos o nosso primeiro disco que foi lançado em janeiro de 1975, que com uma formação de banda, entrou pela primeira vez o contra baixo em trio elétrico e com isso a inclusão de caixas de som para reproduzir os seus graves”, explica Betinho.

Para comemorar o Jubileu de Prata, a Fobica volta às ruas de Salvador em 1975. Os criadores foram homenageados na Praça Castro Alves pelos trios que cantaram “Parabéns pra você” além de terem recebido um troféu pela criação do trio. Dodô e Osmar deixam para sempre o carnaval como músicos e os filhos assumem o bastão.

Os Novos Baianos vêm do Rio de Janeiro e sobem no trio trazendo mudanças técnicas passando a utilizar caixas acústicas, twiters e cornetas Snak e mudanças no repertório, que ficou mais popular. “Com estas mudanças sonoras, em 77, Moraes incluiu no repertório do trio o ijexá, ritmo africano amplamente usado na Bahia pelos Filhos de Gandhy e também o galope e o reggae enriquecendo o repertório rítmico que só era de frevos. Estas mudanças eram imediatamente aceitas pelo povo que logo inventava uma coreografia e de repente toda a praça estava no mesmo balé consagrando assim a criação”, salienta Betinho. Nesse ano a música Pombo Correio é lançada e trio decorado com uma pomba branca.

Um dos criadores do trio elétrico Adolfo Nascimento, mais conhecido como Dodô morre. Em sinal de luto o Tapajós acompanhou um sepultamento envolto em uma faixa preta. Já Osmar morreu em 1997 e em seu sepultamento houve a passagem dos trios elétricos na Castro Alves.

Anos 2000



O trio elétrico comemora o Jubileu de Ouro. O trio Armandinho, Dodô e Osmar continua tocando no carnaval para a pipoca e bandas da nova geração sobem no trio a exemplo da banda Psirico comandada por Márcio Victor, que afirma que começar a tocar em trio foi muito natural já que o ritmo pede.

A guitarra baiana continua a atrair adeptos. “Dá orgulho pra gente de ver hoje a dimensão que isso tomou. Tanto do trio quanto da guitarra baiana. Tinham poucos, Luiz Caldas, Pepeu Gomes da antiga e tem o pessoal novo, Durval (Lelys). Isso divulga o instrumento, isso é muito bom e só me dá orgulho de saber que foi inventado pelo velho Osmar e pelo velho Dodô”, afirma André.

O desenvolvimento tecnológico permitiu o aperfeiçoamento gradativo tanto da estrutura do trio elétrico, quanto da aparelhagem e dos instrumentos. “Naquela época o som, a tecnologia era uma coisa muito incipiente, muito arcaica ainda. Tinha que se descobrir como eles descobriram o pau elétrico. Dodô que fabricava os instrumentos que não existia para vender. Então era uma coisa de pioneirismo mesmo”, enfatiza André.

Qualidade é o principal objetivo de quem faz som no trio e para isso é necessário estudo e dedicação. “O Psirico faz questão de ter um som de qualidade, afinal de contas, a gente trabalha tanto, estuda, pesquisa, e na hora de apresentar ao público, realmente precisa estar tudo direitinho para dar certo. Cuidamos dos instrumentos, sempre procuramos o que há de melhor no mercado, para oferecer sempre a maior qualidade. É uma preocupação de toda equipe, mas principalmente minha porque vim de uma formação percussiva, então percebo facilmente quando tá indo tudo bem ou não”, explica Márcio.

A música de trio há muito tempo atrai diversas vertentes musicais a exemplo do ijexá, inserido no trio por Moraes Moreira. Hoje até o kuduro, ritmo angolano, já faz parte da festa. “Foi muito bacana isso. A primeira vez foi em 2008 quando convidei o angolano Dog Murras e sua equipe para uma apresentação com o Psi durante o carnaval. Deu muito certo, fizemos vários dias, a galera pirou! Afinal de contas, são dois ritmos muito próximos (axé da Bahia e o kuduro, o samba da África) e as danças são muito divertidas também. E foi muito bom, tanto que repetimos em vários shows do Psi, no carnaval 2009 e ainda fizemos grandes projetos juntos. Gravamos música, CD, clipe... foi uma festa! Eles devem retornar em breve.”

Ritmos como forró, pagode e rock também estão crescendo gradativamente no cenário em que há predominância do Axé Music. “Tudo é bem vindo, desde que faça música de qualidade. Eu acho que não importa o ritmo. O que eu gosto de prezar muito é pela qualidade musical, pela qualidade de letras. Isso é que é importante. Qualquer ritmo tem coisas boas e coisas ruins”, sinaliza André.

Esse ano, o trio completa 60 anos e os agradecimentos foram feitos mais uma vez aos criadores Dodô e Osmar, sendo escolhido inclusive como tema do carnaval. Orlando Campos, responsável por manter o sonho do trio elétrico, está hoje com 77 anos e continua grato aos pais da máquina da alegria. “Eles que foram os meus professores e me ensinaram a arte de fazer felicidade e alegria”, finaliza.

Matéria Especial: 25 Anos de Axé!


Depois da Tropicália, movimento comandado pelos baianos Caetano Veloso e Gilberto Gil e que transformou a música do Brasil, surgiu em Salvador uma novidade no cenário musical baiano. Nasceu em 1985, através do som de Luiz Caldas e sua banda Acordes Verdes, o que se tornaria o maior movimento musical proveniente da Bahia, a Axé Music, que completa esse ano 25 anos de história.

O termo Axé Music foi criado pelo jornalista Hagamenon Brito. Ele uniu o termo Axé, utilizado por roqueiros da época para designar aqueles que faziam “música brega”, ao termo Music, existente em Soul Music, Black Music, etc. Apesar do nome pejorativo criado pelo jornalista, o movimento não apenas cresceu, mas se solidificou e permanece no cenário musical através de artistas como Ivete Sangalo, Chiclete com Banana, Timbalada, Daniela Mercury, etc.

Em 1985, o novo jeito de fazer música começou com a canção Fricote, mais conhecida como Nega do Cabelo Duro, composta por Paulinho Camafeu e Luiz Caldas. Essa música é do disco Magia, que deu início ao registro em discos do movimento e teve como banda o Acordes Verdes, que acompanhou de Luiz Caldas nos shows feitos no Brasil e no exterior do disco.

O disco Magia é muito importante na minha carreira e na de todos os cantores e cantoras de Axé Music. Ele possibilitou todo esse sucesso que temos desde 1985. Eu lancei Magia em um momento muito especial da música brasileira, quando tínhamos compositores maravilhosos sem espaço para mostrar suas composições. O regionalismo foi nacionalizado, com a nova música baiana chegando em todo o país”, explica Caldas.

Na época, o Acordes Verdes gravou discos de artistas como Sarajane, Chiclete com Banana, Margareth Menezes e Banda Reflexus. Os arranjos eram feitos por Caldas, Alfredo Moura, Luisinho Assis e Carlinhos Marques. Para Moura, o disco Magia, de Luiz Caldas; A Roda, de Sarajane; e Sementes, do Chiclete com Banana, são alguns dos grandes momentos do axé em termos de arranjos.

Os integrantes da banda eram os únicos músicos de estúdio e o estúdio da cidade era a WR, de Wesley Rangel, que antes gravava jingles e trilhas. “A WR até hoje tem sido o local de nascimento das bandas baianas que fizeram e fazem sucesso nacional e internacional com a música baiana. Minha função foi facilitar a gravação dos primeiros discos dessas estrelas, tanto produzindo, como orientando ou somente facilitando a gravação do primeiro disco de todos aqueles que fazem sucesso até hoje na Bahia”, afirma Wesley Rangel.

Mas a inserção da música feita por Luiz Caldas nos veículos de comunicação ficou por conta dos radialistas, em especial Cristóvão Rodrigues, na época radialista da Itapoan FM, que foi o primeiro a colocar a música Fricote no ar. “No momento valeu mais o feeling. Achei que era uma música que podia dar resultado em termos de programação. E vinha fazendo isso com músicas de outros pontos do país, do Rio de Janeiro, São Paulo e Belém do Pará. Então Luiz Caldas foi mais um que a gente colocou na programação na época, na Itapoan FM. Deu certo, felizmente” declara Rodrigues.

Não demorou para que a primeira cantora de Axé surgisse. Sarajane fez seu primeiro carnaval em 1981, com os Novos Bárbaros e nesse ano ganhou como melhor cantora. Logo aderiu ao movimento. “Entrei no Axé por que era musica de comunidade carente. De onde eu vim”, declara. E foi na Axé Music que a cantora garantiu o sucesso. Em 1986, surgiu de uma brincadeira entre a cantora e o percussionista Davi Guedes, a música que seria um dos maiores sucessos de sua carreira, a música A Roda. A cantora também foi uma das divulgadoras da música negra. “Eu sou a primeira, a quem trouxe e divulgou a música de rua negra das comunidades carentes. Era o que eu sabia, cantar e dançar’, completa.

A música da Bahia sempre foi composta a partir de influências de outras vertentes musicais como samba, reggae, ijexá, galope, frevo, merengue, etc. Com o Axé não seria diferente.

Gerônimo por exemplo, traz em suas canções as influências caribenhas e africanas, com destaque para a última, visto que defende os ideais do povo negro. A música “Eu sou negão”, sucesso até hoje no carnaval, foi composta de improviso pelo cantor em sinal de protesto a discriminação no carnaval de Salvador, protagonizada pelos blocos de trio e os blocos afro. “Uma música de improviso é feita sem previsão. O sucesso veio com a verdade e a dialética. Uma crônica que se passa no carnaval, que ao longo dos anos é o retrato da sociedade que faz segregação e apartheid o tempo todo”, desabafa Gerônimo.

Em meados dos anos 1980, os profissionais de comunicação passaram a acreditar no novo movimento musical, abrindo o leque lançado por Cristóvão Rodrigues. “A partir do momento que um grupo de radialistas da Bahia na metade dos anos 80, entendeu que essa música, esse santo de casa, poderia fazer milagres, você mudou. Não é nada mais do que isso”, ressalta Rodrigues, hoje apresentador da rádio Itaparica FM.

Em pouco tempo, o primeiro movimento genuinamente baiano superou as barreiras mercadológicas e começou a invadir o eixo Rio-São Paulo, onde havia concentração das grandes gravadoras e dos grandes grupos musicais. O programa Cassino do Chacrinha, tinha a presença constante de Luiz Caldas e Sarajane.

A música da Bahia, através do afoxé, também adentrou a teledramaturgia brasileira. É D’Oxum, canção composta por Gerônimo, virou trilha da minissérie Tenda dos Milagres, da Rede Globo. “Isto pode ter sido sorte ou mesmo a energia do orixá ajudou na escolha. A música não fala e não descreve o orixá, mas diz que as pessoas daquela cidade são como a personalidade do orixá. A música entrou na trilha por Dori Caymmi e o seu pai Dorival”, explica o cantor.

As rádios do Brasil não demoraram a veicular as músicas de Luiz Caldas, contando também com o jabá (prática de uma gravadora pagar dinheiro para a transmissão de músicas em uma rádio ou tv) pago pela gravadora, que Caldas garante não ter sido excessiva. “Na época em que lancei a Axé Music as rádios de todo o país tocavam mais meus discos pelo fato de ser algo novo e original, isso já abria muito espaço. No mais, as gravadoras daquela época tinham artistas como Cazuza, Legião Urbana, Lulu Santos, Guilherme Arantes, Titãs, Capital Inicial, dentre outros. Não precisava tanto de jabá assim não, o talento da rapaziada ajudava bastante” diz o cantor.

A inserção dos primeiros cantores na mídia nacional foi fundamental para a disseminação do Axé no Brasil, ao mesmo tempo que em Salvador, mais artistas passaram a se identificar com o movimento e querer fazer parte. Entre os fins das décadas de 1980 e 1990, bandas e cantores solo estariam condensando o movimento, como Tonho Matéria, Daniela Mercury, Margareth Menezes, Banda Reflexus, Ara Ketu, Banda Mel, Timbalada, Chiclete com Banana, Asa de Águia, Jamil e uma Noites, Ivete Sangalo ( Banda Eva), etc.

Músicos e cantores, à medida que aderiram ao Axé, trouxeram influências musicais nacionais e estrangeiras. Assim o movimento nunca se tornou estático e definido. Isso porque a inserção de novas bandas e cantores significava mais inovações no meio musical baiano. Em 1991, Daniela Mercury em seu primeiro disco solo após saída da Companhia Clic, traz na música Swing da Cor, o samba-reggae, gênero dos blocos afros do carnaval de Salvador. Já em 1992, o Ara Ketu insere eletrônica nos tambores, colocando o axé na direção do pop.

A metamorfose contínua talvez tenha sido o principal fator para que o movimento não terminasse e sim agregasse, cada vez mais, um maior número de músicos e artistas. “Axé Music não é um ritmo. Axé Music não é um viés musical. Axé Music é só qualquer música que você faz para diversão na Bahia”, define Cristóvão Rodrigues. A definição de Rodrigues se encaixa na união entre Axé e carnaval, que resulta em diversão. É o momento em que as novidades sonoras produzidas pelas bandas, têm visibilidade e o objetivo é divertir o público. Daí vem a contínua necessidade de inovar e renovar.

Matéria Especial: O axé hoje



O movimento sempre foi munido de mudanças. Mas será que hoje isso permanece? Para Luiz Caldas, mentor do Axé, isso mudou. “Há pouca inovação e muita modificação da mesma célula sonora. Isso não é culpa de ninguém. Só o formato é que apresenta alguma fadiga. É hora de pensar menos em lucro e mais em arte. Sinto que essa seja a única saída para uma melhoria da qualidade e a manutenção do estilo no topo da música” explica.

A mercantilização da música produzida na Bahia, a transformou em uma indústria fonográfica. O empresariado com a intenção de gerar lucro para as empresas, produzem a cada ano, uma quantidade excessiva de bandas. A produção de discos hoje é realizada em estúdios de pequeno porte, que não garantem qualidade. Alfredo Moura vê a composição dos arranjos das bandas de axé como algo repetitivo e que sua produção não é necessariamente mais fácil do que outros ritmos e isso cabe também a produção de discos. “Cada estilo musical tem suas características e isso se reflete nos discos”, afirma Moura.

“Estamos vivendo um momento preocupante. O surgimento de pequenos estúdios levou o movimento da música baiana a uma queda de qualidade impressionante. O artista e os “donos de banda” na Bahia acreditam que uma gravação feita de forma caseira, sem o acompanhamento de profissionais experientes pode ajudá-los a conquistar esse mercado cada vez mais exigente. Para um projeto dar certo é necessário que seja criada uma identidade rítmica, definição de uma linguagem instrumental, qualidade sonora e uma correta definição do público alvo. Sem isso a tendência é o fracasso”, alerta Rangel. Sobre as características fundamentais para produção de um disco de axé, Moura foi taxativo: “Organização, eficiência e criatividade”.

Alguns cantores veteranos ainda inovam, a exemplo de Daniela Mercury, que apesar de ser cantora de axé, já trouxe a música eletrônica e clássica para o carnaval. “O carnaval da Bahia sempre foi plural. Sempre assumiu as várias tendências musicais de qualquer que seja o local de onde ela venha, anglo saxônica, África, Caribe. Eu acho que o carnaval da Bahia é para misturar tudo mesmo” salienta Rodrigues.



No entanto, a inserção de estilos musicais externos sem a mistura com os elementos musicais baianos do samba, ijexá, etc. pode não ser vista como inovação. “Misturar os ritmos resultando em modernas fusões é sempre bom, pois foi assim que a música baiana se firmou no mercado nacional. O problema é que na maioria dos casos estamos “clonando” informações externas e utilizando-as em sua forma quase original o que desprestigia nossa capacidade criativa”, alerta Rangel.

Mas a participação dos estilos musicais baianos, também se dá no carnaval. Desde 1993, com o sucesso estrondoso da banda É o Tchan do Brasil, que contava com as coreografias sensuais, exibidas pelos dançarinos Jacaré, Carla Perez e Sheila Carvalho, o pagode baiano se faz presente. O É o Tchan do Brasil foi a banda baiana que mais vendeu discos, somando 12.000.000 de cópias, sem contar que abriu espaço para o grupo Terra Samba, Companhia do Pagode, Gang do Samba, Harmonia do Samba, etc.

Infelizmente, as pessoas tendem mais a aceitar os estilos musicais que são importados e o preconceito com o pagode, cada vez mais presente no carnaval, ainda é grande. “As pessoas descem o cacete esculhambando o pagode que em geral são músicas de boa qualidade (falando de música). São bem tocadas, tem bons arranjos. Grande parte desta garotada que faz esse tipo de música são bons músicos. Então não tem nada de ruim. O gosto é de cada um”, analisa Rodrigues.

Em meio a polêmicas, influências e transformações o axé sobrevive por mais de duas décadas. Talvez a industrialização da arte não a permita perdurar por muito tempo. Mas isso só o futuro dirá.

domingo, 6 de junho de 2010

Musicália indica...


A Trama dos Tambores

Neste livro, a antropóloga Goli Guerreiro retrata e analisa a música baiana desde a sua origem até os dias atuais. Como as músicas e representações dos blocos afro, de índio, e os trios elétricos ajudaram na constituição do fenômeno musical baiano.

Nova Geração



Ela nasceu em plena terça-feira de carnaval e sempre demonstrou o seu amor pela música. Sua relação com o axé é forte e ultrapassa limites. Atualmente se destaca como revelação no carnaval de Salvador e neste ano, comemorou junto com o axé, os seus 25 anos.

Qual a sua relação com o axé music?
Uma relação de amor forte e antiga. Sou soteropolitana e o axé sempre fez parte da minha vida pois sempre admirei os grandes artistas da nossa música, tinha os seus discos e curtia carnaval. Lembro bem ainda criança quando comecei a curtir muito Netinho, que na época lançou Mila, e também quando Daniela Mercury explodiu no Brasil!

O que é o axé music?
Axé music é um movimento bastante plural, criado em Salvador há um pouco mais de 25 anos e, ao contrário do que muitos comentam, é um movimento sólido e que ao longo desses 25 anos de existência vive se modificando e se reinventando. O axé da atualidade se caracteriza com músicas alegres a fim de animar e alegrar as multidões que correm atrás do trio, o axé sofre influência de diversos estilos musicais, como o rock, frevo, reggae e maracatu, por exemplo, e a percussão esta sempre presente. Luiz Caldas não foi o primeiro cantor de trio elétrico, mas foi o primeiro a fazer sucesso no Brasil e foi batizado de pai do axé. Diferente de como classificamos, o Brasil e o mundo usa o termo Axé para caracterizar que a música é da Bahia, mas nós sabemos que nem tudo daqui é Axé. A palavra axé no candomblé significa energia positiva. Uma saudação!

Quais seus momentos marcantes dentro do axé?
O meu primeiro carnaval em Salvador cantando em 2008, porque era um sonho antigo! E também o carnaval desse ano (2010), onde comemorei os meus 25 anos junto com o aniversário de 25 anos do axé, puxei o bloco Nu Outro neste dia e foi muito emocionante. Nasci numa terça-feira de carnaval e 25 anos depois comemoro meu niver puxando um trio... Nossa, foi inesquecível!

Quem construiu essa história?
Muitos artistas são responsáveis pela história e vida do axé music até hoje, desde Dodô e Osmar com a invenção do trio elétrico até Ivete Sangalo, muitos artistas fizeram sucesso e levaram a nossa música pro mundo. O eterno Neguinho do Samba, que criou o samba reggae do Olodum, não posso esquecer também de Carlinhos Brown com a sua Timbalada.

Ele não virou uma fórmula de sucesso rápido?
Claro que não, o povo não é bobo, se o povo não gosta não existe o sucesso, mas muitos fatores influenciam para o sucesso de um artista. Não existe uma fórmula.

Não é repetitiva em muitos casos?
De uma maneira geral não, fazendo uma análise dos grandes artistas que representam o axé cada um tem o seu estilo de vestir, falar, cantar e algo que o diferencia dos outros no seu som.

De uma maneira geral, a letra é o fraco da axé music e o ritmo, o forte?
O ritmo é muito forte, e em relação as letras tem gosto pra tudo, hoje vejo o sertanejo se reinventando, virando o chamado sertanejo universitário e eles tem o axé como inspiração, tanto na percussão como nas letras. E estão fazendo muito sucesso. Os estrangeiros ficam encantados com o ritmo e em relação à letra não podem julgar porque se fomos traduzir ao pé da letra os grandes sucessos americanos veremos que a nossa letra não deve nada a deles. Na VoaDois sempre tivemos a preocupação com as nossas letras, temos muitos samba reggaes lindos, românticos como muitas bandas de axé antigamente, tipo Banda Mel, Cheiro de Amor...


Quais os grandes momentos da axé music? Falando de discos, músicas, músicos, compositores, arranjos e carnavais.
Ao longo desses 25 anos existiram muitos momentos marcantes, vou falar os principais que me vierem a mente, certo? Em 1992 Daniela explode com O Canto da Cidade no Brasil. Uma cantora cheia de swingue e com discos de qualidade, lindo arranjos, um show bem produzido. Apesar de ser ainda criança, acredito que esse foi um grande momento pro Axé Music. Existiu o momento Luiz Caldas, o momento Márcia Freire, o momento Netinho, o momento Daniela, o momento Ivete Sangalo... A criação do samba reggae por Neguinho do Samba e que teve projeção mundial com o Olodum onde o rei do pop Michael Jackson vem ao Brasil gravar um clipe com a famosa batida do Olodum e se rende ao nosso ritmo, o surgimento e crescimento de Brown, da sua Timbalada e a conquista dele na Espanha também. A presença do Bonno Vox no carnaval de Salvador foi grandiosa também!

Que momentos você destacaria da sua carreira, falando de grandes discos, músicas, compositores, arranjadores e músicos?
Gravamos o nosso último CD, o segundo de carreira no RJ, pela Universal Music, com músicos consagrados como Artur Maia e Gustavo de Dalva que são músicos do mestre Gilberto Gil e gravam os grandes artistas do Brasil e Leonardo Reis que hoje toca com Ana Carolina e que também grava com os maiores artistas do Brasil.
Um disco variado nas canções, onde tem 2 composições da minha autoria, outras de grandes músicos e com arranjos de primeira, esse pra mim foi um grande momento e passo na minha ainda curta carreira de três anos. O CD chama-se “MEU FAROL”.

Musicália indica...




Ritmos em Trânsito

O livro traz extenso panorama histórico sobre a cultura musical baiana. Desde os batuques e sambas do século XIX até a aparição do funk baiano.

Na Base do Beijo...IVETE SANGALO!



No novo CD da cantora Ivete Sangalo, você irá conhecer o sucesso “Na Base do Beijo”. A música ganhou o coração dos foliões no carnaval e deu a artista o troféu de melhor cantora 2010.

Rebolation é bom!


Neste ano, o carnaval de Salvador, conheceu mais uma revelação musical. Desta vez, foi o grupo Parangolé com o cantor Léo Santana, que mostrou todo o seu gingado no swingue do Rebolation.
O grupo que tem um pouco mais de dez anos conheceu o boom do sucesso neste carnaval 2010, após dividir palco com várias estrelas, dentre elas Ivete Sangalo e Saulo Fernandes, da Banda Eva.
Apesar do grupo já ter lançado outras músicas que percorrem por todo o País a exemplo de Favela, Balacobaco entre outros sucessos, o que ficou na boca da galera mesmo foi o “Rebolation”.
O que mais parecia uma brincadeirinha de imitação americana passou a ser a identidade do pagode baiano da nova geração. Hoje, além de o sucesso ocupar o top das rádios baianas e brasileiras, você não anda pelos bares e ruas de Salvador sem ouvir: “Bota a mão na cabeça que vai começar... O Rebolation tion tion, Rebolation”.

A Guitarra da Bahia


Com um som inconfundível, um instrumento nasceu em 1942, nas mãos de dois gênios da música brasileira. Dodô e Osmar criaram um protótipo que logo foi batizado de pau elétrico. Mas foi entre 1977 - 1978, que devido ao grande número de pessoas começarem a chamar o invento de cavaquinho elétrico, que Armandinho filho de Osmar acabou batizando de guitarra baiana, pois o mesmo não tinha mais uma afinação de cavaquinho e já possuía uma forma de guitarra.
Depois dessa primeira fase da guitarra baiana, o próprio Armandinho colocou uma quinta corda no instrumento já que antes existiam apenas quatro cordas. Apenas em 1996 que Aroldo Macedo, irmão de Armandinho, juntamente com Elifa Santana criou o laboratório de pesquisa da guitarra baiana. Pois como o próprio Aroldo explica não tinha quem fabricasse. Segundo ele quando queriam fazer uma guitarra baiana, pegavam uma pessoa e explicavam como gostariam que o instrumento fosse. Daí surgiu essa necessidade de um laboratório que fosse direcionado a criação e confecção da guitarra.
Falar desse grande invento implica também em mostrar a grande importância que ele teve e tem até hoje na caracterização da música baiana dentro do carnaval de Salvador.

Aroldo fala sobre a guitarra baiana


Aroldo Macedo sempre foi um autodidata na música. Sempre teve a curiosidade de aprender a tocar instrumentos, já que a família tinha um grande histórico musical nas veias. Aos nove anos começou a estudar piano e aos doze já tocava bateria. Mas juntamente, com os seus irmãos e o seu pai transformou e modernizou a configuração das atuais bandas de Trio Elétrico, criando o famoso trio Dodô & Osmar. Sendo que em pouco tempo, já estava compondo canções para o trio e se fixando de vez no cenário musical.
A sua ligação com o invento do seu pai é tamanha que ele acabou criando uma escola que ensina meninos carentes a tocar guitarra baiana. Como um bom conhecedor desse instrumento ele fala qual é a diferença da guitarra normal para essa. “A guitarra normal é maior e têm seis cordas, a guitarra baiana é menor e tem cinco cordas” “Tem também as de quatro cordas, mas a que usamos é a de cinco”.
Para Aroldo a guitarra baiana tem um papel fundamental na caracterização da nossa música baiana tocada no carnaval, pois para ele quando a guitarra começou a ser tocada no trio, ela se tornou a alma e o som do trio elétrico. E devido a característica peculiar do som que esse instrumento possui a música baiana começou a ser moldada. Ele diz que até 1975 o trio elétrico ficou sem voz e era praticamente a guitarra baiana que fazia essa voz. E continua dizendo “o trio elétrico influenciou a Tropicália, ele influência o rock feito na Bahia, ele influência a música baiana de uma certa forma”. Em sua visão tudo o que ele aprendeu com o seu pai, ele utiliza hoje para levar uma sonoridade genuinamente baiana para o carnaval. Ele até hoje leva a guitarra baiana criada pelo seu pai para os quatro cantos do país, sendo que segundo ele cerca de 100 pessoas tanto na Bahia como no Brasil tocam o instrumento. Isso o deixa muito contente, pelo fato de existir pessoas tocando o instrumento fora do território baiano.

Retrofoguetes e a Guitarra baiana


O Retrofoguetes nada mais é do que um trio de música instrumental, sendo composto por Morotó Slim (guitarra), CH (baixo) e Rex (bateria). A sua ligação com a guitarra baiana vem de muitos anos atrás, pois o próprio Morotó já tocava o instrumento, criando uma relação musical com o mesmo. Morotó que é um guitarrista que vem do Rock, diz tocar o instrumento, pelo fato de todo músico da Bahia, reconhecer que aqui surgiu a guitarra baiana. Ou seja, para ele todo guitarrista deve entender que somente aqui ela pôde se desenvolver e ser bem tocada pelos seus inventores.
Em sua concepção, pelo menos quem é guitarrista na Bahia deve saber tocar guitarra baiana e conhecer no mínimo a obra de Dodô & Osmar. “Eu quando era criança e ouvia o som do trio elétrico, já ouvia de longe o som da guitarra baiana e já sabia que ali vinha o trio elétrico”. E continua “minha referência musical na infância, antes de rock era a guitarra baiana”.
Na sua visão, a música baiana que era produzida por Dodô & Osmar, pelos Tapajós, pelos Traz os Montes e etc., infelizmente foi esquecida em relação ao tipo de música que se toca hoje na Bahia, que para ele é uma música de caráter totalmente comercial. Mas, em relação a contribuição da guitarra baiana para a música daqui, ele é unânime em dizer que ela ajudou na formação de grandes músicos que surgiram na Bahia. E ele vai além, ao dizer que o som que era feito nesse instrumento usou o trio elétrico para mostrar a sua música.
“Tem muita gente tocando guitarra baiana, como por exemplo, Robertinho Barreto do Baiana System, e Júlio Caldas sobrinho de Luiz Caldas que usa o instrumento como chorinho”. Para ele isso só mostra como esse instrumento encanta a todos e contribuiu para o grande nível de músicos que foi surgindo na Bahia. Em sua visão como músico a guitarra baiana é um instrumento versátil, ou seja, existe várias pessoas tocando em outros estilos e contribuindo para a perpetuação de um dos grandes inventos musicais baiano.

O Baiana System e a Guitarra baiana

Primeiramente o que é o Baiana System? É um projeto musical que tem como ponto de partida a guitarra baiana. Ou seja, é o instrumento que serve de base para toda a linguagem do Baiana System. Robertinho Barreto idealizador do grupo e guitarrista da banda Lampirônicos, explica que o objetivo maior nada mais é do que levar a guitarra baiana para outros contextos, saindo um pouco do carnaval. Ele explica que o nome Baiana System vem da idéia do Sound System, que são sistemas de som Jamaicano como o Dub, por exemplo.
É com a guitarra baiana que o grupo vai costurando as suas canções e arranjos, construindo um diálogo com a voz que se mistura e cria a idéia do Sound System. Em sua opinião a guitarra baiana perdeu um pouco da sua participação nas grandes bandas de carnaval nos dias de hoje. Para ele isso se deu ao fato de aparecer a figura do cantor de forma incisiva deixando esse instrumento em segundo plano. E complementa “a música seguiu o caminho mais Pop, tendo a incorporação de outros elementos, assim atrapalhando o seguimento da guitarra baiana”.
Mas ele é categórico em reconhecer toda a contribuição desse invento na construção da música da Bahia, ao dizer “o papel dela vem dessa colaboração direta com a criação do trio elétrico e com a configuração do carnaval de rua que se tem hoje.” E complementa “a guitarra baiana serviu como embasamento estético e cultural do que veio a ser a música baiana”.
Para Robertinho Barreto esse trabalho com o Baiana System é justamente não deixar a guitarra baiana presa ao universo do carnaval. Em sua concepção se ela conseguir dialogar com outras vertentes, com outras estéticas e referências ela irá despertar nas pessoas um caminho para que elas a vejam com outros olhos e entendam toda a beleza do som que é tocado nesse instrumento.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

O Som dos Afoxés





Primeiramente o que quer dizer a palavra Afoxé? É a enunciação que faz algo acontecer. Assim, Afoxé em Iorubá significa encantamento, ou seja, uma palavra eficaz e operante. De fato, o Afoxé surgiu na Bahia no ano de 1949, com o intuito de preservar e espalhar os valores e características de uma africanidade. As cores e os símbolos dessas entidades estão ligados diretamente a preceitos religiosos, assim juntando o passado com o presente e o reino dos deuses com os dos homens.

Mas por outro lado, existe uma característica forte nos Afoxés que se resume no som no qual eles produzem. De fato, as melodias entoadas pelos Afoxés são cantigas que vêem dos terreiros de candomblé já que o mesmo é considerado como um “candomblé de rua”. Essas músicas nos desfiles, geralmente são puxadas em solo e depois repetidas por todos. Sobre os instrumentos, basicamente são três usados com mais freqüência: o Agbê, também chamado de Xequerê que é uma cabaça coberta por sementes ou contas, o Atabaque que são de três tipos (Rum, Rumpi e o Lê) traduzindo o som do afoxé e o Agogô que dita o ritmo dos outros instrumentos.

O som do Ilê Oyá

Com o seu primeiro desfile carnavalesco em 1979, o Afoxé Ilê Oyá foi conquistando seu espaço e mostrando o poder da sua musicalidade. Com Iansã como orixá protetora “Ilê Oyá” significa Casa de Iansã e foi fundando por membros do candomblé Ilê Axé Oyá. Atualmente o Afoxé, desenvolve atividades de ação social nos bairros de Barros Reis e Vida Nova no município de Lauro de Freitas. Essas atividades são em grande maioria artísticas, culturais e educativas. Localizado no bairro de Pau Miúdo, a instituição tem como presidente Estelita Alves que fala pela organização.

A musicalidade do Ilê Oyá, durante muito tempo foi construída com muita pesquisa e dedicação por parte dos envolvidos e tem como cerne musical o ritmo Ijexá. As suas músicas se inspiram nos orixás da Bahia, principalmente em Iansã que é venerada pela instituição desde o seu surgimento. Assim, são melodias religiosas e dedicadas as divindades do candomblé e com forte influência nas religiões de matrizes africanas.

Como na maioria dos Afoxés, tem como instrumentos musicais base para a construção das suas respectivas canções os Atabaques, Agogôs e Xequerês. Instrumentos esses, que representam para a instituição uma forma de fazer música de raiz com qualidade. Para Estelita Alves, ainda há dificuldades no que diz respeito a inserção das músicas do Afoxé no carnaval de Salvador. Em sua opinião ainda não se chegou a uma abrangência, na qual as suas respectivas melodias possam ser reconhecidas e cantadas por todos.

Sobre as dificuldades que a instituição passa diariamente, está a falta de um patrocínio que forneça possibilidades do bloco ser mais visto e apreciado pelas pessoas. Estelita explica que isso é uma luta que há muito tempo ela tenta vencer, com o intuito de mostrar a potencialidade artística do seu Afoxé. Mas em sua visão isso não afeta na musicalidade do mesmo, que busca sempre uma forma de compor músicas que exaltam a religiosidade, juntamente com os seus orixás e a sua mãe protetora Iansã.

O som do Afoxé Bloco Ijexá da Bahia



O significado do nome desse Afoxé remete-se a África, pois a palavra Ijexá vem de uma tribo africana, no qual os membros marcam o rosto com três cortes. Além do mais, Ijexá também é um ritmo tocado na comunidade do candomblé da cidade de Salvador, sendo possivelmente a matriz rítmica do próprio samba.

Tudo começou na década de 1980, quando o cantor e compositor Germano Cruz criou o afoxé Rum Py Lé, que durante alguns anos desfilou pelas ruas de Salvador no período carnavalesco, encerrando as suas atividades em 1984. Mesmo assim, os fundadores não desistiram e seguiram em frente criando mais tarde o Afoxé Bloco Ijexá da Bahia, que hoje tem a sua sede localizada no bairro do Engenho Velho da Federação com a Presidente Antônia de Jesus. Mas quem fala pela instituição é Germano Cruz.

O Afoxé se baseia basicamente no ritmo Ijexá que vem da África para construir a sua musicalidade, ou seja, eles vão além das fronteiras, buscando ritmos novos em outros continentes. Sem falar do candomblé que tem um papel importante na música do bloco. Germano explica que a inspiração para a construção das canções estão nos temas que todo ano se renovam na avenida além das batidas advindas de uma negritude que eles fazem questão em preservar. Esse ano, por exemplo, o grupo trabalhou com a temática da Rainha das Águas Yemanjá.

Pelo fato do Afoxé fazer um som Ijexá mais moderno segundo Gemano, a cobertura da mídia apesar de não ser muito grande contribui em parte para a divulgação das suas melodias e também das suas atividades artísticas. Ele diz que isso ajudou ao bloco seguir em frente, diferentemente de outros que acabaram se fixando em uma música mais interna dos candomblés. Mas ele salienta, que ainda há muita discriminação por parte de veículos de imprensa e também da própria população que ver de uma forma deturpada o som que advém dos Afoxés.

Os instrumentos base desse bloco se resumem nos atabaques que tocam uma música moderna e de expressão. Germano confirma que o Bloco Ijexá da Bahia tem nas suas músicas influências de matrizes africanas, pois sem elas não faria sentido desfilar nas ruas da cidade durante o carnaval. Além também de explicar que é o candomblé o grande incentivador e a verdadeira essência do bloco. Germano por fim fala que a música do Bloco Ijexá da Bahia é uma música que respeita as diferenças e é feita com muito amor e trabalho árduo.

O som do Filhos de Omolú

Com políticas afirmativas de resgate e valorização de uma cultura afro-baiana, o Afoxé Filhos de Omolú foi criado no ano de 2007 e vem até hoje desfilando pelas ruas na época do carnaval. Mas de fato o primeiro desfile do bloco foi em 2008 com temas baseados no candomblé. Assim as Iabás e Babalorixás do terreiro Ilê Axé Filho de Ogum da comunidade de Lobato tiveram grande influência na construção dessa instituição, quando levou todos os membros para desfilar no carnaval iniciando as atividades desse bloco.

Atualmente, o presidente Francisco Cruz que fala pelo Afoxé, mantém os ensaios do grupo no Mercado Santa Bárbara (Cabula VI), no qual comparecem muitas pessoas que são ligadas e tem simpatia pelo bloco. A instituição possui atividades sociais que se baseiam em aulas de reforço escolar para crianças e adolescentes do bairro do Lobato já que a mesma tem a sua sede instalada na região.

Como nos outros dois Afoxés descritos nessa matéria, o Filhos de Omolú tem o ritmo Ijexá nas suas músicas. Assim constatando uma predominância do mesmo nos Afoxés da Bahia. As formações dessas músicas novamente se baseiam nos temas que o bloco escolhe, como em sua grande maioria destinados a orixás, não fugindo desse padrão os Filhos de Omolú.

Para o presidente do bloco, existe um preconceito sobre as músicas dos Afoxés. Já que a grande maioria dos blocos saem pela madrugada, não ajudando na divulgação do trabalho dessas instituições. Ele lamenta também, que a mídia da pouco espaço em jornais, rádios e emissoras. Mas isso não enfraquece a música dos Afoxés que encantam milhares de turistas todos os anos, segundo ele. Atabaques, Agogôs e Xequerês são os instrumentos utilizados com maior freqüência entre os músicos do Filhos de Omolú.

Novamente é um bloco com influências de matrizes africanas e reafirmam que se consideram um candomblé de rua. Francisco Cruz, por sua vez, fala que o maior desafio no que se refere na construção das músicas do bloco é a falta de um patrocínio vigente para eles. Em sua opinião, as grandes empresas deveriam colocar fé nos Afoxés de Salvador já que eles são a raiz do carnaval da cidade.


Portanto, a musicalidade dessas instituições que se baseiam em raízes, faz parte da construção de uma festa que há muitos anos se alimenta da magia dos Afoxés: o carnaval de Salvador. Afoxés esses como: Filhos de Gandhy; Filhos de Korin Efan; Ilê Oyá; Filhos de Omolú; Filhos de Olorum; Bloco Ijexá da Bahia; Filhos do Congo entre outros, que fazem parte de uma cultura de raiz africana e embeleza as ruas da cidade na época da folia.

Cantar cada melodia, sentir cada uma delas faz com que as pessoas sintam uma música que é feita com conteúdo histórico e acima de tudo com simplicidade. E ver um Afoxé passar sempre nos renova como filhos de uma terra que exalta música e alegria.
Onde vai, papai ojô/ Vou depressa por aí/ Vou fazer minha folia/ Com os filhos de Gandhy/ A nossa turma/ É alinhada/ Sai do meu bloco/ Pra fazer a patuscada/ É mori, moriô, babá/ Babá, ô, kiloxê, jocô. (Música: Patuscada de Gandhy)

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Carnaval: Festa popular...e paga?


O Carnaval da Bahia é considerado uma das maiores festas populares existentes em todo o planeta. Desde o seu surgimento, o carnaval se mostra como sendo uma manifestação artística que atinge maciçamente o povo, principalmente, o baiano.

Há alguns anos, um assunto vem incomodando muita gente, dentre eles, os foliões que curtem a festa de maneira ‘pipoqueira’. Alguns músicos, empresários e profissionais envolvidos nesse ramo vêm abrindo uma série de discussões que envolvem a criação de espaços fechados dentro da festa carnavalesca. A partir desse interesse, muitas dúvidas surgiram na cabeça do povo. Será que o carnaval de rua vai acabar? Será que os circuitos não estão sendo mais adequados? A criação de espaços fechados não seria uma forma de privatizar a festa?

Em busca dessas possíveis respostas, a equipe Batuque foi ao encontro de dois representantes que poderia, no mínimo, falar algo a respeito. Músico, compositor, líder do Asa de Águia e também arquiteto, Durval Lelys, não acredita na “privatização e sim na ampliação” da festa. Enquanto que, a pesquisadora e escritora, Aninha Franco, argumenta que “muitas manifestações populares foram privatizadas em Salvador, a partir dos anos 80, pelos mesmos grupos”.

Carnaval: Festa popular...e paga?


Revista Musicália – O carnaval é uma festa popular? Na sua opinião, quais são as características que o apontam como tal?
Durval Lelys – Sim. Porém a presença da classe alta e média também é notada nos anexos do carnaval (nos blocos, camarotes).

Revista Musicália – Desde o seu surgimento, o carnaval se mostrou como sendo uma manifestação artística que atinge maciçamente o povo baiano. Como você vê a privatização da festa?
Aninha Franco – Muitas manifestações populares foram privatizadas em Salvador, a partir dos anos 80, pelos mesmos grupos. Bonfim Light, Conceição Light, etc. são interiorizações de festas de largo, completamente populares, e que eu desconfio que nada têm a ver com as festas originais. O Carnaval foi a maior das apropriações.

R.M – Qual a sua opinião acerca da privatização da festa? Isso ajuda ou prejudica no contexto da festa?
D.L – Não sou a favor da privatização e sim da ampliação. A privatização teria que mudar todo o modelo do carnaval que segue desde seu inicio e se isso acontecesse não seria mais uma festa popular. As privatizações que existem hoje como blocos, arquibancadas e camarotes são produtos do desenvolvimento do carnaval, devido a proporção que a festa tomou.

R.M – Com a privatização, o carnaval perde sua essência?
A.F – O carnaval volta para dentro dos clubes. Não esqueçam que ele existia plenamente, nos anos 70, sem a turma dos clubes.

R.M – Um dos argumentos usados para a criação de espaços fechados no carnaval são os circuitos que não estão mais suportando tanta gente. Em sua opinião, os circuitos da festa são adequados? Em que sentido isso afeta o carnaval?
D.L – Eles são sempre adequados por um determinado tempo de existência. Depois eles passam a ser saturados como aconteceu comigo no circuito Avenida que, superlotou e desci para o Barra - Ondina e agora lá também esta superlotado, devido aos outros artistas da Avenida também estarem descendo para a Barra, sem contar com os novos blocos e bandas que surgem a cada ano. Cada vez que cria-se um novo circuito, deve-se criar também uma estrutura proporcional as necessidades que vão exigir.
As soluções seriam as opções que são criadas ao longo dos anos, pelos empresários e entidades carnavalescas para que criem e executem projetos interessantes. Na minha visão de ampliação do carnaval, tenho algumas ideias que acrescentariam no glamour da festa, sem perder o lado filosófico de manter a festa popular, de manter o povo na rua sem pagar nada e criar produtos comercializáveis adequados a manutenção do mesmo.

A.F – Os circuitos são pacotes de camarotes + bandas + cordas + abadas + estrelas de trio que representam o Carnaval baiano, hoje, em todo o País. Esses circuitos são sorvidos pela elite econômica nacional e pipocados pelo povo pessoalmente ou pela TV.

R.M – Uma grande parte dos foliões que saem as ruas para pular o carnaval saem na pipoca e pertencem a uma classe de baixa renda. Você não acha que com a criação de espaços fechados esses foliões não iriam ficar excluídos deste contexto da festa?
D.L – Repito, não sou favor da privatização e sim da ampliação. Esse espaço existiria no meu projeto, para as pessoas pularem sem ter que pagar nada, como também teria um espaço pago para quem quisesse ficar mais tranqüilo, isso é uma questão de conceito. Por exemplo, para mim, o Asa de Águia tem que tocar para todos nos formatos que existem, como nos carnavais fora de época, que tem o espaço privado em alguns Estados e o carnaval de rua com seus camarotes como Natal, Aracaju, Campina Grande e outros mais.

A.F – Esse carnaval, dos grupos, corre o risco de virar um carnaval de época na época do carnaval. E murchar. Nos anos 90, existiam carnavais de época o ano inteiro, no Brasil inteiro e até em Miami. Acabaram. Dêem uma checada em quantos existem hoje...E porque resistiram.

R.M – Afinal, em sua opinião, o carnaval é uma festa popular?
Aninha Franco – Nós só estamos discutindo ela porque ela é popular.

Trajetória Musical - Margareth Menezes


Batalha e persistência são as palavras que definem sua trajetória na música. Mulher negra, pobre e nascida em Salvador, superou as condições adversas e adquiriu inserção tanto no cenário nacional quanto internacional. Acredita que a sorte e a fé em Deus também a ajudaram.

Começou cantando em casas noturnas de Salvador e continuou fazendo teatro até 1990. Em seu primeiro ano de carreira, quando tinha 22 anos, gravou a música “Faraó- Divindade do Egito” a convite de Djalma Oliveira, sendo esse o primeiro registro oficial da música, o que foi uma grande honra para a cantora.
O disco intitulado “Elegibô”, um dos de maior sucesso, a levou para o mercado internacional, onde recebeu o rótulo de identidade Brazilian African Pop. A revista Rolling Stone, em 1991, classificou o álbum como um dos cinco melhores do mundo no cenário da World Music. Em 2004, foi considerada pelo jornal Los Angeles Times, a “Aretha Franklin brasileira”.

Atualmente comanda o movimento AfroPopBrasileiro, que com a iniciativa da cantora nasceu no carnaval de 2005, objetivando a preservação da identidade cultural afro-brasileira através da união de blocos afro voltados para a afirmação da cultura negra.

Trilhar o caminho a música não é fácil, como é possível perceber a partir da trajetória da cantora. Mas para aqueles que pretendem enveredar no meio musical, Maga deixa a dica: “Procure ter diferencial no que faz, e ser inteligente para não se deixar levar pelo mal gostou que impera por aí. Já vi muita gente ir e vim nesse movimento, e acho que todo artista tem que focar um discurso, o meu acho que foi: "Eu sei o que eu não quero cantar, o resto tudo é experimentação".

Perfil Musicado com Margareth Menezes


Uma das maiores cantoras da música baiana, Margareth Menezes, a Maga, completará 25 anos de carreira em 2012, já fez 15 turnês internacionais, ganhou o Troféu Imprensa de melhor cantora de disco em 1988 e em 2001, ganhou o troféu Dodô e Osmar com a música mais tocada no carnaval, “Dandalunda”. No entanto, a música começou cedo a fazer parte de sua vida. “Desde quando eu comecei a cantarolar minhas primeiras sílabas”, declara.

A família influenciou a cantora no gosto pela música porque o pai comprava discos de samba e forró e os tios, assim como o avô, tocavam violão. Aos 15 anos ganhou um violão e teve como mestre seu Nonô, segundo ela um excelente professor de matemática e música, com quem aprendeu a dedilhar o instrumento. Margareth também fez teatro, o que contribuiu para a definição da sua formação que ela define como popular com cultura e arte.

Eclética, tem como influências musicais desde o forró de Luiz Gonzaga à Tropicália com Caetano Veloso e Gilberto Gil. Também inclui na lista o rock de Raul Seixas, Rita Lee e Secos e Molhados; o samba de Clara Nunes e os sambas do Recôncavo baiano; gênios da MPB como Ângela Maria, Elis Regina e o rei Roberto Carlos. Sem contar o apreço pelas estrelas internacionais como Jimmy Hendrix, Janis Joplin, Led Zepellin e Bob Marley.

Caetano Veloso, Rita Lee, Clara Nunes e Gilberto Gil, também estão na lista dos cantores preferidos, seguidos de Chico Buarque, Milton Nascimento e Alcione. Entre os internacionais estão Tina Turner, Michael Jackson, Elton John e George Benson. Já entre os instrumentistas estão Paco De Lucia, Léo Gandelman, Santanna, Jimmy Page, Beethoven, Vivaldi, Carlinhos Brown, Gerônimo, Ilê Ayê, Cortejo Afro e Olodum. Tudo que a enriquece culturalmente entra na lista. Já as músicas, desde quando não agridam sua origem nem a sua cultura, são bem vindas.

Apesar de ter tido aulas de violão, Margareth não diz que toca o instrumento. “Não posso dizer que toco violão. Dá pra fazer músicas. Isso é uma coisa que me persegue um pouco. Sei que posso desenvolver esse instrumento melhor, mas não tenho muita disciplina, por incrível que pareça. Mas é um projeto de vida melhorar isso, vou fazer”, confessa.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

O Lado Alternativo do Carnaval


O ritmo Surf Music e os Retrofoguetes

A surf music ganhou o espaço do carnaval de Salvador com um trio de música instrumental chamado Retrofoguetes. Criado em 2002 (Salvador), o Retrofoguetes é um dos mais conceituados no circuito independente, sendo composto por Morotó Slim (guitarra), CH (baixo) e Rex (bateria). A banda é ambientada na literatura, no cinema e nas HQs de ficção – científica. CH Straatmann diz, que as sua influências se baseiam na Surf Music dos anos 60.

Com o álbum “Ativar Retrofoguetes”, os rapazes foram indicados em 2004 ao prêmio Claro de Música na categoria Melhor Disco de Música Instrumental. No ano de 2008 o guitarrista Morotó Slim recebeu o prêmio de melhor instrumentista do ano pelo Troféu Dodô e Osmar, que premia os melhores do carnaval, assim os fortificando cada vez mais no cenário da música.

Partindo para o cenário do carnaval e dos ritmos alternativos, CH Straatmann que fala pelos três, expressa a sua opinião ao dizer que existe inúmeros fatores que contribuíram para que esses ritmos ficassem à margem da folia. Um deles é o fato de Salvador durante muito tempo não ter uma secretária exclusiva para a cultura; era a secretária de cultura e turismo. Assim, para eles as ações culturais eram voltadas para o formento do turismo, fazendo com que a música de carnaval fosse vendida como a cara da cidade.

O baixista continua a dizer que apesar da variedade musical que se encontra no carnaval, que vai do Samba do Recôncavo, passa pelo Frevo Elétrico da Guitarra Baiana até a MPB, ainda existe uma predominância da Axé Music dentro da festa. “Nós achamos que o melhor caminho é a diversidade e os espaços precisam ser criados”.

No carnaval de Salvador o Retrofoguetes têm projetos futuros. Eles pretendem dar continuidade ao Projeto com o trio no carnaval e apresentar material inédito para o Retrofolia, com um disco de Frevos Elétricos.

Um espaço alternativo: Palco do Rock

A cada ano aproximadamente 32.000 pessoas durante quatro dias, são mergulhadas em um evento que já acontece há mais de 15 anos: o Palco do Rock. Vindas de todos os cantos da cidade e do Estado, além de outros países, esse evento começou a ser pensado desde 1991, quando reuniões no antigo espaço Sabor da Terra (Jardim dos Namorados) foram feitas para se discutir uma possível realização do Palco do Rock.

O presidente do evento na época Humberto (Tedão), teve de início a idéia de colocar o Rock no carnaval de Salvador, no formato do Trio Elétrico, mas essa tentativa durou três anos sem êxito. Quando Sandra de Cássia, atual presidente, ingressou no grupo, a idéia de se criar um palco, no período do carnaval e com local específico surgiu. Com isso poderia agregar todos os estilos Rockers.

Durante todos esses anos de realização do evento, dificuldades e conquistas foram se atribulando ao Palco do Rock. Primeiramente, a grande dificuldade de todas foi enfrentar a discriminação da inclusão desse gênero no carnaval da cidade. Foram muitas ações realizadas para de fato implementar tal feito, desde invadir a prefeitura até várias declarações acaloradas nos diversos veículos de comunicação.

As conquistas foram surgindo como forma de calar a boca de muitos que queriam sufocar esse evento. Como aconteceu na administração de Imbassahy, que cortou os cachês, assim piorando a estrutura do Palco do Rock. Mas em 2005, quando mudou a administração da cidade, o Palco do Rock voltou as ruas, fazendo de um trio parado, um palco. Daí em diante, o evento foi melhorando a sua qualidade e em 2009 ele foi contemplado pelo Fundo de Cultura do Estado da Bahia, que retornou com os cachês das bandas. Conseqüentemente, dentro do evento outros espaços foram surgindo, como o Espaço Interativo e neste ano o Espaço Infantil.

Sobre a estrutura do Palco do Rock, todo ano ela é revista para que seja melhorada conseqüentemente. Desde a qualidade de som e iluminação à implementação de banheiros químicos. Sem falar que a prefeitura disponibiliza uma rede de ônibus para que todos possam curtir o evento a vontade.

Na opinião dos organizadores do Palco do Rock, esses espaços alternativos na época do carnaval são ótimos, pois prezam pela questão identidária e a real diversidade. Para eles a diversidade, deve ser trabalhada respeitando identidades e especificidades. Assim, para os organizadores o carnaval de Salvador é uma festa linda de se ver do jeito que ela foi criada. Com isso existindo espaço para todos, sendo ocupados de forma responsável e respeitosa.

Programação do Palco do Rock 2010

Local: Coqueiral de Piatã – Salvador
13/ 02 (Sábado)
17h – Dom Lula Nascimento
18h – Fridha
19h – Vivendo do Ócio
20h – Redoma (RS)
21h – Cólera (SP)
22h – Karne Krua (SE)
23h – Três Puntos
00h – Desrroche
01h – Behavior

14/ 02 (Domingo)

17h – Mensageiros do Vento
18h – Ignivomus
19h – Ênio e a Maloca
20h – Astafix (SP)
21h – Dead Fish (ES)
22h – Vendo 147
23h – Survive (AC)
00h – Andranjos
01h – Dimensões Distorcidas

15/ 02 (Segunda)

17h – Buster
18h – Davi Zew
19h – Fiddy (PE)
20h – Ulo Selvagem
21h – Korzus (SP)
22h – Agrotóxico
23h – Elipê
00h – The Honkers
01h – Keter

16/ 02 (Terça)

17h – Aluga-se
18h – Chá de Pensamento
19h – Etno (DF)
20h – Clamus (CE)
21h – Phantom Rockers (EUA)
22h – Suprema (SP)
23h – Pastel de Miolos
00h – Os Irmãos da Bailarina
01h - Almadória

Nancy Viegas e o seu Rock no Carnaval



Cantora, compositora e produtora Nancy Viegas tem uma forte ligação com o carnaval de Salvador. Uma artista que começou a sua trajetória musical desde o seu colegial, com uma banda chamada Crac que durou 10 anos e depois com a banda Nancyta e os Grazzers que participou de inúmeros festivais de música pelo Brasil. O seu trabalho como produtora musical vai desde a produção de discos do Retrofoguetes e do Zambotronic até gravações de estúdio com inúmeros artistas do meio alternativo.

No carnaval especificamente esse ano, Nancy esteve nos dois circuitos em trios com propostas diferentes. O Carnivália com a Pitty e o Radiola no centro e na Barra/Ondina com o grupo Quilombola Soul. Para ela foi uma experiência muito emocionalmente, principalmente no centro da cidade. Ela acha que com a inserção de ritmos alternativos no cenário da festa, isso acarreta uma grande vitória para a diversidade e um ponto de partida para uma maior democratização, apesar dela salientar que ainda existe um lado comercial da festa.

Nancy Viegas busca em suas essências para a sua formação musical artistas variados como: Tom Waits, Mike Patton, Mutantes, James Hetfield, Chico Science, Smetak, Villa Lobos, além da literatura Beatnik que mexeu com a maneira dela pensar sobre música.

Sobre o rock Baiano, em sua concepção, Nancy acredita que está mais forte do que nunca. Com novas bandas fazendo shows e conseqüentemente gravando novos materiais. Para ela os espaço destinados a todas as bandas e artista do rock estão reservados para cada um deles tanto dentro como fora do carnaval, a partir do momento, que os mesmos apresentam um trabalho legal.

O Reggae na Folia



Quem nunca foi embalado pelo envolvente som do reggae que atire a primeira pedra. Um ritmo que mistura música folclórica, ritmos africanos, ska (combinação de elementos caribenhos) e o calipso (ritmo caribenho). Surgido na Jamaica, esse gênero musical ganhou repercussão mundial na década de 1970 e na voz de Bob Marley encantou multidões. Outros nomes também contribuíram para a fortificação desse estilo de música como é o caso do Delroy Wilson, Bob Andy, Burning Espear, Johnny Osbourne, além das bandas The Wailers, Ethiopians, Desmond Dekker e Skatalites.

No Brasil, o reggae foi mais forte na região Norte do país, mas na Bahia ele foi incrementado numa das festas mais populares do planeta: o Carnaval de Salvador. Aqui, com os blocos de reggae, esse ritmo ligado a força Rastafari defende a justiça social e a equiparação de direitos através da música, arte e cultura. Situados na sua grande maioria no Pelourinho, esses blocos como o Aspiral do Reggae, Banana Reggae, Surf Reggae, Reggae - O Bloco, Diamante Negro, Ska Reggae, Coração Rastafari e Filhos de Jha, contribui a cada carnaval para o amadurecimento desse ritmo que vai ganhando espaço na folia.

Falar do reggae no Carnaval de Salvador é desafiador pelo fato desse gênero durante alguns anos ser colocado de lado em contraposição aos grandes ritmos da folia como o Axé e o Pagode. Para Jussara Santana – coordenadora e produtora musical do Bloco Aspiral do Reggae a causa disso vem das marchinhas e dos modismos do Axé que foram tomando conta do cenário da festa. Mas ela salienta que o reggae está presente nas vozes de Edson Gomes, Ras Ciro Lima, Sine Calmon entre outros.

Na opinião de Amilton Santana Cunha representante do Bloco Diamante Negro o reggae não estar diretamente à margem do carnaval da Bahia, mas para ele existe uma monopolização que é feita pelos grandes empresários e pelos grandes blocos que colocam grandes estruturas com mais de 6000 mil foliões e um exército de cordeiros, promovendo a segregação humana (Centro x Periferia).

Os representantes do reggae (os blocos) no carnaval da cidade se constituem em um grande personagem, sendo estimulado pelo público que respondem de forma positiva a essa inserção desses ritmos alternativos. Muitos deles fazem projetos sociais como as entidades Diamante Negro que mantém oficinas de capoeira, dança e percussão, o Aspiral do Reggae que promovem palestras sobre diversos assuntos, desde alimentação natural até a importância da cultura Rastafari, Ska Reggae com as suas oficinas de capoeira e artesanato, o Coração Rastafari que trocam seus abadares por alimentos não perecíveis depois do carnaval entre outros blocos.

O reggae é um dos ritmos alternativos da folia, juntamente com o rock entre outros que aos poucos foi se contrapondo e ganhando força no carnaval. Como Jussara diz o reggae continua na resistência e persistência no cenário da festa mais popular do mundo.